
POR
NOGRAFIA.
VÍCIO TRANSFORMA PORNOGRAFIA
EM FONTE DE SOFRIMENTO PARA INTERNAUTAS
Distúrbio causa ansiedade, depressão, disfunção erétil e desinteresse pela vida sexual com parceiros
Por Gabriel Lopes Witiuk, Hanna Siriaki Lenartovicz e Vinicius Paiva Scott
O vício em pornografia tem ganhado destaque na mídia e em clínicas de psicologia, apesar de não ser cientificamente comprovado. Entre os efeitos do transtorno estão ansiedade, depressão e desinteresse em relacionar-se sexualmente.
A indústria pornográfica movimenta mundialmente US$ 97 bilhões ao ano, segundo o jornal britânico The Week. Os dados, relativos a 2014, também revelam que cerca de 12% dos sites existentes no mundo virtual são de conteúdos pornográficos.
O ator americano Terry Crews, famoso pela atuação no seriado “Todo mundo odeia o Cris”, confessou em redes sociais, no início de 2016 , ser viciado em conteúdos pornográficos desde os 12 anos. A admissão intensificou a discussão sobre o assunto. Confira, abaixo, o relato do ator:
Visando combater o vício da pornografia, o fórum de internet chamado "No Fap" (sem masturbação, na tradução livre) conta com 178 mil usuários que relatam os vícios e buscam ajuda. A comunidade foi criada em 2011 pelo ator americano Alexander Rhodes, que decidiu inventá-la para se autodesafiar a abster-se da masturbação por uma semana.
Também há um fórum brasileiro dedicado ao tema, chamado de "Como parar". O site nacional incorpora as ideias do americano, incluindo diários sobre as dificuldades do tratamento e relatos feitos por namoradas de viciados em pornografia.
Um vício pode ser definido como um distúrbio que torna um ato impróprio para o fim ao qual se destina, explica o psicólogo e sexólogo Guilherme Falcão. No caso do vício em pornografia, o sistema de recompensa do usuário é afetado, já que o sexo se torna acessível instantaneamente, sem depender de relações com os outros. Ou seja, o sistema de recompensa premia o viciado por assistir pornografia, e não por manter uma relação sexual.
O fórum argumenta que o vício em pornografia é um distúrbio comportamental que superestimula os desejos sexuais. Além disso, o exagero presente na pornografia faz com que o viciado fique desinteressado em potenciais parceiros ao seu redor.
O vício geralmente se desenvolve quando o usuário usa a pornografia para contornar sentimentos negativos, como depressão ou estresse. Um sinal do vício é a progressão de conteúdos sutis para material com teor explícito. O fórum compara isso ao alcoolismo, em que o viciado progride da cerveja para bebidas com maior teor alcoólico para continuar sob o efeito da droga.
Sexólogo, psicólogo e filósofo explicam o vício
A pornografia é um prazer considerado proibido, que, devido ao acesso fácil, afeta o sistema de recompensa do indivíduo, afirma o sexólogo Guilherme Falcão. Ele diz que a pornografia mostra cenas que não podem ser repetidas em um relacionamento com compromisso, desenvolvendo desejos no usuário que não são aceitos ou possíveis de serem realizados pelo parceiro. Com isso, o viciado prefere se satisfazer sozinho do que com outra pessoa, intensificando a busca pela pornografia.
O vício pode se desenvolver já na infância e é capaz de provocar disfunção erétil, além de problemas de concentração, depressão e fobia social, conta o sexólogo. Ele afirma que já teve clientes com esse distúrbio e que o tratamento é demorado e focado em conversas acerca do sentido de vida para se obter uma sexualidade saudável.
Há três casos principais de vício, conforme o psicólogo Leonardo Araújo:
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Pessoa com relacionamento estável que possui fetiches não aceitos pelo parceiro e busca-os na pornografia;
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Pessoa que tem dificuldades em manter um relacionamento e busca na pornografia a satisfação sexual;
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Pessoa que enxerga pornografia de modo idealizado e se frustra por não ter o mesmo desempenho que os atores nos filmes.
A pornografia é um mundo fantasioso que apresenta fetiches que as pessoas não costumam realizar no mundo real, esclarece o psicólogo. Nela, o sexo é apresentado como “superficial, frio e compulsivo”, conforme ele descreve. Araújo ressalva que a masturbação e as fantasias são saudáveis em um relacionamento, desde que sejam feitas em consenso e de modo não exagerado.
Na análise do filósofo Márcio Jarek, a indústria cultural transformou o sexo em uma mercadoria e padronizou os gostos sexuais. Ele afirma que a indústria cultural atua sobre a sexualidade, fazendo com que determinado perfil estético seja visto como o ideal para a apreciação do público. A revolução sexual dos anos 1960 seria uma forma de combater essa padronização, ressalta o filósofo.
Tratamento envolve abstinência de três meses
Os fóruns de ajuda aos viciados denominam o processo de cessar o vício como “rebooting” (reinicialização, em tradução livre). É um ciclo em que a pessoa se abstém da pornografia, masturbação e, em alguns casos, até de orgasmo, para recuperar o aspecto saudável da própria sexualidade. O processo se chama de reinicialização, pois o usuário precisa “resetar” o sistema de recompensa do cérebro, além dos desejos sexuais.
Os usuários criam desafios de abstenção como forma de vencer o vício, e cada um tem no perfil a quantidade de dias em que está sem assistir a conteúdos pornográficos. O desafio oficial lançado pelo fórum brasileiro dura 90 dias, para uma reinicialização completa.
Para evitar impulsos causados pela falta de masturbação, o fórum recomenda aos usuários praticarem hobbies, como forma de evitar o tédio. Caso o desafio não seja cumprido, o usuário precisa zerar a contagem de dias de abstenção do próprio perfil.
Se, mesmo com a reinicialização, a pessoa tiver desejos, é recomendável que ela visite o fórum e converse com outros usuários. Ainda é possível acionar o botão de pânico do site, que redireciona a pessoa para um site contendo frases motivacionais.
Internauta relata, no fórum brasileiro "Como parar?", a reação a 90 dias de abstinência de masturbação
Conheça histórias de internautas que superaram o vício
O usuário Symotts2 está há dois anos sem consumir pornografia. Ele percebeu que o vício foi responsável pelo fim de um namoro. Ao iniciar o tratamento, o usuário foi promovido no trabalho, iniciou exercícios físicos, aprendeu a velejar, a dançar tango e a mergulhar. Durante o período do vício, ele conta que as emoções por parentes estavam “dormentes” e que, com o tratamento, passou a ter mais amigos e interagir mais com mulheres.
Alguns usuários pensam em suicídio durante o programa. Um exemplo é o internauta Asfur, que desde os 12 anos faz “masturbação prone” (superestimulação das genitálias de bruço, sobre o chão ou num colchão). Ele ressalta que praticava o ato de quatro a cinco vezes por dia e que o vício atrapalhava os estudos. “Pornografia é altamente eficaz em destruir e cega, vem das profundezas do inferno”, escreveu no fórum. Asfur já tentou cometer suicídio duas vezes, mas recebeu apoio no fórum e está há mais de um ano sem ter contato com material pornográfico.
No Brasil, uma história de sucesso é a do usuário Justiceiro do Sertão (veja imagem acima). Ele conta que, aos 13 anos, começou o vício e que a masturbação diária prejudicou os estudos e a relação com amigos e familiares. Um ano depois, entrou em depressão e pensou em suicídio, mas desistir e decidiu dedicar-se aos estudos. Nessa época, o rapaz tentou combater o vício em pornografia, mas somente ao conhecer o fórum brasileiro, em 2014, passou a entender melhor do assunto e absteve-se por três meses. Ele conta que, após vencer o vício, se sente no “paraíso” e que a relação com familiares ficou estável.
Benefícios do tratamento:
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Aumento do autoestima;
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Redução da ansiedade;
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Geração de mais tempo livre;
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Ampliação da capacidade de a pessoa se socializar;
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Elevação da capacidade produtiva: pessoa fica com mais energia para criar conteúdo e resolver problemas no ambiente de trabalho;
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Fim do receio de ser “descoberto” por parentes ou amigos.
Dificuldades do tratamento:
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Aumento da ejaculação noturna ou espontânea;
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Vontades sexuais em momentos inoportunos;
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Vasocongestação (acumulação de sêmen);
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Momentos de frustração e tristeza durante a reinicialização (efeito causado pela desintensificação do sistema de recompensa).
Quiz: Você é viciado em pornografia?
1) Você assiste pornografia diariamente?
Sim
Não
2) Você interrompe estudos ou tarefas para assistir pornografia?
Sim
Não
3) A pornografia te atrai sexualmente mais que as pessoas ao seu redor?
Sim
Não
4) Possui problemas como ansiedade, depressão e baixo estima?
Sim
Não
5) Sente mais prazer com a masturbação do que com a relação sexual?
Sim
Não
6) A frequência e duração das sessões pornográficas tem aumentado nos últimos anos?
Sim
Não
7) Seus gostos sexuais tem adentrado para o “tabu” após começar a assistir pornografia?
Sim
Não
8) Você sente vontade de assistir pornografia quando está em uma situação aborrecente ou deprimente?
Sim
Não
9) Se sente envergonhado ou tem medo que parentes e amigos descobrem que você assiste pornografia?
Sim
Não
10) Possui disfunção erétil ou ejaculação retardada?
Sim
Não
Resultados
De 0 a 4 respostas "Sim": você não é viciado em pornografia. Entretanto, caso sinta que a pornografia atrapalha a sua vida de alguma forma, procure assistência com um especialista.
De 5 a 6 respostas "Sim": você possivelmente não é viciado, porém tem muitas características que podem evoluir para um vício. Avalie se a pornografia é algo que você procura para remediar sentimentos negativos, como a depressão. Caso seja, procure assistência com um especialista.
De 7 a 10 respostas "Sim": Você provavelmente é viciado em pornografia. Procure assistência com um especialista.
